continuando no meu mundo.
ontem, ao sair do trabalho, decidi-me por um desvio de horas antes de regressar a casa. depois de sair da Covilhã em direcção a Unhais da Serra, passo por uma das zonas mais bonitas deste interior à mão. paro a meio caminho, em Cortes do Meio, para uma ida à água. era capaz de viver ali. gostava de viver por ali. ou noutra aldeia qualquer enfiada numa destas encostas tão bonitas onde parece que o tempo tem outro ritmo. sou mulher da aldeia. não percebo porque investi num apartamento na cidade pequena. agora, nem num futuro próximo, terei possibilidade de mudanças. não é grave. podia estar em Lisboa e ser uma profunda infeliz (ainda mais) no meio do trânsito e de prédios a mais.
talvez seja uma alma velha e provinciana. quero o tempo dos dias lento, quero o aborrecimento de não ouvir carros, quero não ter de lidar com gente agitada no stress matinal, diário. quero as ruas da aldeia para as miúdas brincarem na rua, nas quintas, entrarem em casa para jantar com a melhor sujidade, das mãos na terra.
e agora vou trabalhar. enfiada no openspace que odeio (não percebo esta cultura moderna dos espaços tecnológicos abertos, com gente a mais). o rabo colado à cadeira durante, pelo menos sete horas (hoje, provavelmente, mais).
quando estou triste (jesus, tantas vezes, é normal de normalizado pela média?) balanceio entre a música que acompanha o ritmo natural ou forço umas batidas mais resistentes e uns up, up girl. não é bem o dia... já ouvi esta uma boa dezena de vezes, colada aos sensores, com pequenos intervalos do Yet Again. yes, again the Slow Life.
penso estar a fazer as coisas diferentes, a melhorar, a não deixar de arriscar e termina exactamente como sempre. abre-se um novo fosso e sinto-me a perder pessoas. invade-me novamente uma grande tristeza, com a única diferença de que agora já não me deixa angustiada. apenas e unicamente triste. é uma aceitação sem retorno. procuro outras vias de me fazer sentir, de não me ir morrendo enquanto perco.
***
agora na varanda com o portátil no colo a musicar o ambiente e uma mini preta na mão. vejo a noite a cair, deixando de ver o fumo que chega até aqui, mas a manter o cheiro que foi de morte. sinto-me pequenina, egoísta, fechada no meu mundo.
penso estar a fazer as coisas diferentes, a melhorar, a não deixar de arriscar e termina exactamente como sempre. abre-se um novo fosso e sinto-me a perder pessoas. invade-me novamente uma grande tristeza, com a única diferença de que agora já não me deixa angustiada. apenas e unicamente triste. é uma aceitação sem retorno. procuro outras vias de me fazer sentir, de não me ir morrendo enquanto perco.
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agora na varanda com o portátil no colo a musicar o ambiente e uma mini preta na mão. vejo a noite a cair, deixando de ver o fumo que chega até aqui, mas a manter o cheiro que foi de morte. sinto-me pequenina, egoísta, fechada no meu mundo.
oh god,
Bon Iver, querido, podias cantar sempre assim, sem parecer que te estão a apertar os tomates (com os consequentes extra agudos de dor).
well done.
well done.
cair da cama
não foi literalmente mas doeu como se o tivesse sido. a luz das seis e meia da manhã, acompanhada pelo insistente despertador, obrigaram-me a acordar de uma noite a sonhar sobre as minhas frustrações. outra vez a rotina a meter-me numa bóia de salvamento: os pequenos-almoços, beijos e abraços às minhas beloved e o trabalho.
Escutei, à distância, o som de um trompete e perguntei ao criado o que significava. Ele não sabia nada, nada ouvira. Frente ao portão, deteve-me e perguntou:
- Onde vai o meu amo?
- Não sei – respondi – Daqui para fora, vou-me embora, apenas. Daqui para fora, é só, só assim conseguirei atingir o meu objectivo.
- Então vossa senhoria sabe qual é o seu objectivo? – Perguntou novamente.
- Sim – retorqui – Já te disse: daqui para fora, é esse o meu objectivo!
—Franz Kafka, A Partida
sete horas da tarde
e o que me apetecia era sentar-me e não fazer a ponta de um corno. recordo a entrevista lida há um par de horas: a força mais poderosa é
estar interessado em alguma coisa. pode ser a Dinastia Ming, o que quer
que seja, se estiveres interessado o suficiente para o estudar e
aprofundar, então não corres perigo. eu corro perigo. o meu psi diz-me isto há algum tempo, essa coisa do fazer e do interesse. já comecei quinhentas e quarento oito coisas diferentes. a maior parte delas mentalmente, poucas foram as que viram vida e dessas todas foram efémeras. o melhor que consegui foi não estar parada tanto tempo, não que o mexer-me fosse [seja] efectivamente produtivo. é o possível. o que me reduz a uma espécie de derrota mas tenho demasiada preguiça para mais. e medo. muito. enfim, julgo que percebi o ponto até ao qual consigo resistir. um milímetro a menos ou mais e catrapumba, escangalho-me e mais do que querer sentar-me, quero é dormir.
agora vou fazer o jantar [ao contrário do muito que se diz sobre as desvalorizadas rotinas, elas salvam].
agora vou fazer o jantar [ao contrário do muito que se diz sobre as desvalorizadas rotinas, elas salvam].
Tem tudo o que procurava? Sim? Então agora vamos tomar um belo café.
Sim, a retórica política é capaz de matar. A política pode assassinar por meio da linguagem. O horror do movimento nazi foi largamente baseado na retórica, na propaganda. Muito mais poderosas do que qualquer exército são as mentiras do totalitarismo. O totalitarismo funciona através da linguagem. E também existe outro fenómeno: pode ser-se um grande artista e um assassino, uma pessoa a favor do extermínio. Há um momento muito importante nos diários de Cosima Wagner, em que Wagner está lá em cima, no primeiro andar, e ela ouve-o ao piano a rever o 3º ato do “Tristão”. Ele desce para almoçar, e de que é que eles falam? De como queimar os judeus. O homem que tinha estado a compor a melhor música do mundo desce para almoçar e discute alegremente como livrar-se dos judeus. O que quero dizer é que eu não poderia viver num mundo sem a música de Wagner. A minha dívida para com ele é enorme. A minha dívida para com Nietszche, para com Céline! Que livros belos e horrendos! Não tenho resposta para estas pessoas. Não há explicação. Perante os gigantes temos de ficar calados.
Mas, acima de tudo, o meu lema foi saber que a força mais poderosa é estar interessado em alguma coisa. Pode ser a Dinastia Ming, o que quer que seja, se estiveres interessado o suficiente para o estudar e aprofundar, então não corres perigo. Se te prendes a qualquer coisa — pode ser arqueologia, música, desporto — que seja maior do que tu próprio, não corres perigo. O terrível é quando as pessoas se prendem a uma nada, ao vazio.
***
Mas, acima de tudo, o meu lema foi saber que a força mais poderosa é estar interessado em alguma coisa. Pode ser a Dinastia Ming, o que quer que seja, se estiveres interessado o suficiente para o estudar e aprofundar, então não corres perigo. Se te prendes a qualquer coisa — pode ser arqueologia, música, desporto — que seja maior do que tu próprio, não corres perigo. O terrível é quando as pessoas se prendem a uma nada, ao vazio.
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Entrevista a George Steiner: expresso.sapo.pt/sociedade/2017-06-10-George-Steiner-O-verdadeiro-crime-e-viver-demasiado-1
OCD
A thousand times, a thousand times
I’ve had that dream a thousand times
mil vezes pode ser muito, ali a roçar a obsessão.
ou não.
ser nada mais que um grande desejo que se prolonga no tempo.
vou ouvir a thousand times.
ontem, como hoje, a mais pequena pergunta porque há pessoas que não vão à festa de aniversário dela. aos seis anos tive de lhe explicar aquilo que não me apetecia que ela sentisse, que percebesse. que os laços podem ser mais frágeis e incertos do que gostariamos, que não faz sentido um pai não estar porque simplesmente não quer, que amigos têm mais que fazer, que não é por mal, simplesmente apareceram outras coisas urgentes para as pessoas fazerem e não podem estar, mas que gostam muito dela e que tenho a certeza que gostariam de estar presente neste dia.
depois engasguei-me. literalmente. tinha ali um nó qualquer que fez com que a saliva fosse para o canal errado. um cagaço do caralho. enquanto não entrava o ar, uma agarrou-se às minhas pernas a chorar e a outra, a mais velha, a bater-me nas costas. naqueles segundos não vi a minha vida em restrospetiva. vi o futuro delas e ... acalma-te, Rita, porra acalma-te e fiz sinal à mais velha para ir chamar os vizinhos. voltei a respirar. uffa.
hoje o dia é teu menina linda. ninguém vai remexer na merda e intensificar as faltas. conta quem está, com a garantia que provarei que a vida avança bonita.
depois engasguei-me. literalmente. tinha ali um nó qualquer que fez com que a saliva fosse para o canal errado. um cagaço do caralho. enquanto não entrava o ar, uma agarrou-se às minhas pernas a chorar e a outra, a mais velha, a bater-me nas costas. naqueles segundos não vi a minha vida em restrospetiva. vi o futuro delas e ... acalma-te, Rita, porra acalma-te e fiz sinal à mais velha para ir chamar os vizinhos. voltei a respirar. uffa.
hoje o dia é teu menina linda. ninguém vai remexer na merda e intensificar as faltas. conta quem está, com a garantia que provarei que a vida avança bonita.
aqui tudo é bonito
Eu nem cá dentro me caibo
Mas bate a cabeça no teto
E cai na travessa
Eu já calei o discurso
Que a língua tropeça
Mas o gigantismo amordaça
***
Eu já não sei inventar-me
É só mais do mesmo
Fermento em massa de autismo
Eu nem de mim já me pasmo
Há mar e marasmo
Há ir e voltar aforismo
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